Pesquisa Operacional: morta, mas não enterrada
Em ensaio publicado em 1979 no Journal of the Operational Research Society, Russell Ackoff desferiu severas críticas contra a área da qual é um dos principais genitores. Sob o título “O Futuro da Pesquisa Operacional é Passado”, ele decreta a morte da Pesquisa Operacional apoiada no tratamento limitado e displicente, tanto pelo meio acadêmico quanto empresarial. A leitura do texto impacta não só pela contundência, mas principalmente pela sua contemporaneidade: as inadequações relatadas, sem esforço, poderiam ter sido escritas na época atual. Não obstante a longínqua data de publicação, não há absolutamente nada de antigo na alocução do autor.
Ackoff esmiuça que a redução da utilidade ocorreu de maneira progressiva, para camadas inferiores da hierarquia organizacional, onde residem problemas mais simples e facilmente compatíveis com a modelagem matemática. Apesar do diagnóstico assertivo, a transferência afastou sua concepção inicial: a Pesquisa Operacional já era largamente reconhecida como uma área destinada ao uso de modelos matemáticos em vez da “capacidade de formular problemas gerenciais, resolvê-los e implementar e manter suas soluções em ambientes turbulentos”*. O autor enfatiza a desconsideração do campo que, em algum momento, “quando já não era possível empurrá-lo para baixo [na hierarquia organizacional], foi empurrado para fora”*. De modo idêntico, está o tratamento recorrente nas escolas de administração de empresas nos dias atuais, onde a disciplina de Pesquisa Operacional é bastante abreviada, quando não retirada da grade curricular.
Em consonância com o ataque contra a “perversão técnica”, nota-se que o envenenamento da Pesquisa Operacional perdura, ainda hoje, em eleger docentes ineptos para a tentativa de ensino. Comumente professores de estatística, cálculo e, em maior frequência, professores de Excel se atrevem a se apresentar para lecionar. A intoxicação aconteceu por legitimações absurdas ao longo da última década, nas quais se convencionou associar “modelagem matemática” como equivalente a “ensinar planilhas”.
A exumação continua. Ackoff alude, no final da década de 1960, a valorização no ensino dos métodos quantitativos nas escolas de negócios, declarada como “boa moeda de troca”. Como resultado, o ensino da Pesquisa Operacional concentrou-se exclusivamente na esfera matemática. Com a evolução dos algoritmos computacionais, o ensino foi transferido para a linha de tecnologia da informação, rebaixando a Pesquisa Operacional à aplicação de softwares e, por vezes, aviltando-a em ferramentas computacionais para o jazigo da elaboração de planilhas. Assim, permanece exterminada sua característica inicial, cujo exórdio fora totalmente interdisciplinar, vinculado às necessidades bélicas da Segunda Guerra Mundial.
Definitivamente, é assombroso verificar que, quase cinquenta anos após a publicação, a Pesquisa Operacional tornou-se um corpo insepulto, praticamente sem chances de ressurreição. Em 1979 já se advertia: “nas duas primeiras décadas da Pesquisa Operacional, sua natureza era determinada pela natureza das situações problemáticas que enfrentava. Agora, a natureza das situações que enfrenta é determinada pelas técnicas que tem à sua disposição”*. A Pesquisa Operacional permanece em um quadro de desídia pela própria academia, à mercê da incompreensão corporativa e sufocada pelos modismos tecnológicos de cada época. As características dos problemas empresariais alteraram-se consideravelmente desde os primórdios da década de 1930 até aquela data. Já se passaram 46 anos. Qual a chance da humanidade finalmente começar a entender a natureza das situações problemáticas em vez de seguir refém de algoritmos ou ferramentas programadas da tal Era Digital?
* Trechos com tradução livre do texto original.
Referência
1. Hall Jr, J., Hess, S. (1978). OR/MS dead or dying? RX for survival. Interfaces 8, 42-44.
PARA CITAR: